sábado, 15 de fevereiro de 2014

Crepúsculo dos Ídolos


É difícil, quase impossível, desvincular-se do tempo-espaço para fazer uma análise fria de qualquer fato. Por isso é tão raro que tenhamos a percepção de que algo histórico está a acontecer diante de nossos olhos, sob nossos braços. Muitas vezes é necessário que haja um tempo de maturação do pensamento – individual e coletivo -; que os dias absorvam pré-conceitos, que os meses borrem o sentido de realidade e que, por fim, os anos revertam expectativas - agindo como iconoclastas ou endeusando marginalizados de outrora - e reconstruam narrativas.

Leonardo Moura está apenas a um jogo (e deve ser um Flamengo e Vasco) do seu 467º com a camisa do Flamengo, o que o inclui, isoladamente, entre os dez jogadores que mais atuaram pelo Rubro-Negro em toda a história. Ao lado de Zico, Júnior, Adílio, Andrade, e à frente de lendas como Joel, Tita, Dida, Rondinelli e de outro lateral direito: Leandro, o “Peixe Frito”.

Perto de completar uma década de Flamengo, Léo Moura já foi campeão Brasileiro, bicampeão da Copa do Brasil, tetracampeão estadual e ajudou a livrar o time do rebaixamento em pelo menos três ocasiões graves.

Léo estava lá quando a bomba explodiu na Gávea e quando o capitão do time foi preso por assassinato. Estava lá nas inúmeras vezes em que o muro amanheceu pichado, em que viraram as faixas de cabeça para baixo no estádio e em que não havia um toque sequer na bola sem uma vaia acompanhando da arquibancada. Léo estava lá treinando e jogando enquanto Adriano faltava, e Juan arranjava briga; enquanto Tardelli e Marcinho promoviam orgias em Minas Gerais e enquanto Ronaldinho aparecia atrasado, ainda sob efeito da vodka com energético da noite anterior.  

Léo Moura não é santo e já errou muitas vezes, com toda certeza, dentro e fora de campo. Eu mesmo, confesso, já o acusei de corpo mole, de displicência e de ser mau marcador. Outro dia, porém, vendo um jogo do Flamengo– não lembro qual – acompanhado por dois vascaínos, tomei as dores do Léo Moura quando começaram a criticá-lo (aquela coisa do “é meu e só eu posso falar mal”) e a contestar sua condição de ídolo. Pensei.

No dia seguinte da derrota por 3 a 0 no FlaFlu, ele postou uma foto na piscina no Instagram e foi xingado por alguns torcedores. Após a derrota para o León, ouvi duas vezes um “O Léo Moura ein...não sei não” de pessoas próximas. 

Nove anos de Flamengo – grande parte do tempo em crise. Quatrocentos e sessenta e seis jogos representando 35 milhões de torcedores. 

Eu não quero corroborar com a hipocrisia e nem ser acusado, mais tarde, de nostálgico. Esperar ele se aposentar – com ou sem Libertadores – e eu ser questionado pelos meus filhos e netos para admitir, para eles e para mim mesmo, que o Léo Moura era foda. O tempo não precisa destilar seu veneno ou aplicar seu antídoto. Ele é foda, e essa é a História. 



Por Beto Passeri.






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