terça-feira, 9 de julho de 2013

The Queen needs you, Andy

Fonte: The Times

A leitura da vitória de Andy Murray em Wimbledon pode ir muito além da (re)conquista dos britânicos de seu "próprio território", digamos assim. É muito significativo que, após 77 anos aplaudindo outros jogadores erguendo o troféu mais tradicional do tênis, os ingleses tenham voltado a bater palmas para alguém "de casa", como já havia sido nas Olimpíadas do ano passado. 

E a primeira observação é sobre essas aspas quando digo "de casa", pois tanto as Olimpíadas quanto Wimbledon foram/são disputados em Londres, e Murray é escocês. Há, em todas os debates - e nas próprias entrevistas do jogador - a brincadeira de que 'ele é britânico quando ganha e escocês quando perde'. Minha experiência etílica-socio-cultural de dois meses em solo da Rainha, com londrinos e escoceses, me passa uma credibilidade mínima para afirmar que o fundo de verdade é maior do que a brincadeira nesse caso. 

Se fosse o contrário - Murray fosse inglês e os títulos fossem na Escócia -, não acho que haveria grandes problemas. Mas Londres (isso não se aplica a Inglaterra como um todo, de maneira alguma) é "The Heart", o coração do Império Britânico, é sério, educado, polido, espetacular. Ninguém diz, mas a Escócia é meio "primo farofeiro" (nos padrões londrinos, claro); o sotaque é estranho, soa meio caipira, eles gostam muito de festa, enchem a cara de uísque até não poder mais, dançam de saia na rua, enfim, fazem uma arruaça não muito britânica. Sinceramente, não conheço bem o Murray. Pelo que já observei, imagino até que ele seja um escocês mais inglês que a maioria, mas isso não muda muita coisa. As manchetes dos jornais, os outdoors, a conversa nos pubs, tudo exalta Andy Murray como herói , ídolo britânico. Não que esse seja o sentimento, mas é uma necessidade.

Uma necessidade de um povo com uma sina que resultou num complexo curioso: o de possuir a patente de inúmeros esportes e terminar, quase sempre, superado pelos outros (e, ainda pior, suas ex-colônias). Eles inventam, criam regras, apaixonam-se por aquilo e...perdem. Perdem para o Paquistão e para a Índia no críquete, perdem para a Nova Zelândia e para a África do Sul no rúgbi, perdem para os Estados Unidos no golfe e no beisebol, e para quase todo mundo no tênis e, pior, no esporte mais popular do planeta, o futebol. Ainda que o Campeonato Inglês seja o mais importante, que seus times sejam podres de ricos, organizados, que Londres seja a cidade com mais clubes e estádios de futebol, o fantasma está lá e incomoda muito: a Inglaterra, mãe do futebol, só ganhou uma Copa do Mundo em sua história, a de 66, jogando em casa e derrotando a Alemanha com um gol que é discutidíssimo até hoje.

Os britânicos e, sobretudo, os ingleses, sentem-se lesados. "A gente cria o esporte, leva até lá, ensina eles a jogarem e depois apanha?". É muito frustrante. Acrescente-se a isso a falta de grandes nomes, de heróis que ajudem a dimensionar, a significar uma geração, uma era no esporte. Como foi Pelé, Michael Jordan, Schumacher, o próprio Tiger Woods. Apostou-se muito em Hamilton, mas a Fórmula I está longe de arrancar suspiros tão apaixonados e, mesmo que assim fosse, Hamilton não é esse cara. 

Sobrou para Andy Murray, o pobre escocês eternamente semifinalista que não conseguia ultrapassar a linha do bom para o vencedor, do muito bom para o campeão. Mas Murray rompeu essa barreira - muito mais psicológica do que técnica - e fez isso justamente em Londres, duas vezes. Nada menos que em uma Olimpíada e em Wimbledon, o Grand Slam mais tradicional do mundo. O talentoso tenista escocês virou ídolo do esporte britânico. O jovem agora é Sir.

The Queen needs you, Andy.



Por Beto Passeri.








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